As bolhas em que vivemos e a quem elas interessam

O Colunista de COMCAFÈ, Leandro Duarte tem 28 anos, é formado em Gestão pública pela Uninter – especialista em Design e Comunicação Estratégica e em criação de identidades visuais para marcas e produtos, trabalha como designer autônomo. Com especialização em Ciência Política pelo Espaço Ética, é o atual presidente do Partido dos Trabalhadores  (PT) de Porto Barreiro.

Há uma tendência global crescente e preocupante que assombra a democracia e o debate político e social saudável. A tendência a que me refiro é o que chamo de demonização ideológica.

  A ideologia consciente molda o caráter humano e evita que nós tornemos fanáticos ou mercenários. Fanáticos do tipo que não enxergam possíveis erros e desvios morais de seus pares; e mercenários que mantém sua dignidade sempre à venda sem levar em conta qualquer valor moral pessoal.

Por esse motivo a ideologia é de extrema importância na construção de uma sociedade justa e igualitária, mas, é preciso ficar atento ao que nossas ideologias fazem de nós e como nos comportamos com o que elas nos tornam.

Nos últimos anos, com a acessão das chamadas redes sociais, pudemos presenciar esse processo de  demonização ideológica; esse fenômeno de degradação da capacidade de discordância respeitosa se tornar cada vez mais frequente. Parece não existir mais espaço para o debate de ideias; a regra em uso se tornou o ataque direto ao portador da mensagem e não a própria mensagem.

Ideias, valores, crenças e tudo mais que forma a ideologia de vida de cada um de nós, seja política, religiosa ou econômica, nos marca como bons ou maus aos olhos daqueles que vivem em uma bolha ideológica; e as redes sociais, citadas anteriormente, com seus algoritmos que nos mostram apenas aquilo que gostamos, concordamos e queremos ver, tem fomentado a cada dia mais essa idiotização em nossa sociedade dita moderna.

O reflexo deste fenômeno trágico pode ser presenciado nas redes sociais ou em cada esquina. Tente expressar sua posição política, religiosa ou econômica em uma conversa com mais de duas pessoas e se você não for insultado muitas vezes durante a conversa de forma velada ou explicita, de duas, uma, você está vivendo mais profundamente em uma bolha do que pode perceber ou as pessoas com que você convive sabem a importância do debate e são civilizadas o suficiente para respeitar e tentar compreender as razões que levam a ter a ideologia que tem quando essa ideologia não é baseada em ódio e sim em respeito as diferenças e a dignidade humana.

Indivíduos que vivem em bolhas ideológicas costumam possuir características que denunciam sua incapacidade de dialogo e sua completa intolerância. Eles reproduzem o que veem e ouvem, e o muito pouco que leem, de toda e qualquer fonte de senso comum sem verificar a veracidade e tornam-se repetidores de pensamentos que não são os seus; pensamentos criados por grupos políticos e sociais que desejam atrofiar a capacidade de pensamento racional e a empatia destes indivíduos expostos a seus conteúdos. Indivíduos que, em sua grande maioria, possuem um profundo senso de repressão pessoal de suas emoções e desejos e que agem, ou melhor, reagem, a partir deste desconforto com a liberdade de pensar e de agir de outros.

São pessoas que parecem ter perdido a capacidade de enxergar além de si mesmas, de seu modo de pensar e de ser, tornando-se, dessa forma, prisioneiros dentro de si mesmos. Aos poucos vão perdendo a capacidade de convivência pela sua incapacidade de discordância respeitosa que poderia, e pode, levar o individuo que pensa diferente a vir pensar como ele, uma vez que seu trato respeito e compreensível somado as evidências de um saudável debate de ideias faria seu opositor perceber que talvez esse e não aquele sistema de pensamento esteja mais ajustado com a realidade.

Não somos bons ou maus, honestos ou corruptos, por sermos de direita ou de esquerda, por seguirmos a doutrina desta ou daquela religião, por termos riqueza financeira ou sermos pobres, por sermos crentes ou descrentes, por termos essa ou aquela orientação sexual, ou qualquer que seja a diferença que possamos ter em um mundo em que a diferença é tudo o que temos em comum. O que nós torna bons ou maus, se é que podemos estabelecer tal conceito a não ser sendo mau tudo aquilo que gera dor, é o que fazemos com a ideologia que temos e não a ideologia em si, uma vez que, nenhuma delas é uma produção da natureza e extrínseca ao mundo natural, mas, sim uma produção humana advinda de nosso passado histórico, de nossas experiências com os significado que damos as mesmas e fruto de nossa arcaica linguagem e primitiva capacidade de transmissão de nossas emoções em relação aos fatos a que somos expostos cotidianamente em sociedades cada dia mais conflituosa. Conflituosa, acredito eu, por essa nossa mal-educada capacidade empática, de nossa primitiva linguagem e de nossa profunda incapacidade de transmitir a história sem um viés maniqueísta.

Nesse contexto social de bipolaridade onde as pessoas parecem enxergar apenas preto ou branco ao invés de uma grande paleta de cores e matizes, é importante que todos nos perguntemos: Quantos progressos fizemos pela dignidade humana agindo de forma odiosa? A resposta, como você sabe, é nenhum! Então que saiamos das bolhas e comecemos a perceber a realidade em seu quadro geral e não apenas aquilo que queremos ver. Só desta forma conseguiremos organizar nossa sociedade e as instituições que a compõe de forma a não sermos governados por pessoas sem empatia, ser respeito à dignidade humana e que pensam apenas em poder, conforto e riqueza pessoal.

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