Violência contra a mulher é feio para quem pratica: Roseli Cecatto fala sobre a  tentativa de feminicídio que sofreu

“Amor não se força, o amor é livre, espontâneo. Quem ama deseja ver o outro feliz e não submetido”, recado de desabafo de Roseli, às pessoas machistas.

Seria apenas mais uma mulher vítima de violência, não fosse a coragem da secretária Roseli Cecatto, 43, que foi vítima de tentativa de feminicídio, no dia 10 de abril, quando ao chegar em sua casa, em Laranjeiras do Sul, encontrou seu ex-companheiro, Claudinei Praxedes de Souza, de tocaia dentro de sua casa (por ele arrombada) e com faca em punho.

Roseli que era separada e tem dois filhos, de 17 e 11 anos, do primeiro casamento, começou um relacionamento com Claudinei, em 2015. Ela conta que no início foi tudo tranquilo, que a convivência dele com seus filhos era boa, que ele era bem vindo e bem recebido por sua família. Já, a relação dele com a própria família era mais distante, exceto com uma irmã e um cunhado, com os quais mantinha maior proximidade.

A disposição de Roseli em prosseguir no relacionamento foi diminuindo na medida em que Claudinei passou a não ser transparente com ela. Como exemplo, cita a compra de um veículo em seu nome, o que resultou em prejuízo para ela, pois foi informada pela loja que mesmo tendo pago uma boa quantia pelo a automóvel, teria de devolver, pois o carro que ele dera na troca, não era quitado, conforme Claudinei havia lhe garantido.

“Outros fatos desagradáveis aconteceram no final de 2017. Então, conversei com ele e tomei a decisão de me separar. Mas torcia pelo seu bem, que fosse feliz do seu jeito”, relata Roseli, observando que Claudinei, exigiu dinheiro por ocasião da separação, tendo ela repassado uma quantia em espécie e repartido alguns bens com ele. Logo em seguida, ele teria passado a procurar Roseli com insistência para que retomassem a relação, tendo pedido ajuda aos familiares dela e para amigos de ambos. “Eu conversava com ele, explicava que não tinha intenção de voltar. Parecia que depois dele ter recebido o dinheiro que exigiu, ia ficar tudo bem”, ressalta.

Mas nos últimos dias, as insistências de Claudinei vieram acompanhadas de ameaças. Ele prometia matar. “Dizia que se eu não ficasse com ele, não ficaria com mais ninguém”, conta Roseli.

No dia em que resolveu pôr em prática sua vingança por não aceitar a liberdade de escolha da ex-companheira, Claudinei chegou a passar na casa da mãe dela, dona Ieda Reni Garske, 68, e disse que todo mundo estava pedindo para ele não matasse a Roseli. Mas que mesmo assim, faria. “Ele passou na minha casa, e ameaçou. Eu pedi para ele não dizer bobagem, que tomasse um chimarrão e conversasse comigo. Ele tomou uma cuia de chimarrão e logo saiu dizendo ‘ela vai para o saco’”, lembra a mãe de Roseli, que tentou ligar para a filha e alertá-la. Mas ela tinha deixado o celular em casa, e a sobrinha que poderia ajudar, também não estava conectada naquele momento.

Além de facadas, Roseli teve o rosto rasgado por Claudinei

“As primeiras investidas foram com uma faca que ele levou. Mas após ele me desferir alguns cortes, houve a quebra da ponta dessa faca e eu consegui toma-la. Foi quando ele colocou uma das mão na minha boca, acredito que para eu não gritar, mordi seu dedo, e então ele começou a rasgar minha boca e rosto com as mãos”, relata a vítima que ao se ver livre do agressor, que pulou o muro e fugiu, conseguiu levantar e ir pedir socorro. Como estava perdendo muito sangue, ela saiu com as chaves de seu carro na mão, para que alguém dirigisse e a levasse até o Hospital. Mas os dois primeiros pedidos de socorro foram negados pelo primeiro e pelo segundo homem que encontrou. Felizmente, encontrou uma vizinha, que mesmo estando com a filha pequena, correu para deixar a criança com outra pessoa e socorreu Roseli.

A prisão de Claudinei

A pressão do Conselho da Mulher foi grande para que a polícia localizasse Claudinei. No entanto, dois dias depois (em 12/04), ele se apresentou na 2ª SDP de Laranjeiras do Sul, se reservou ao direito de falar somente em juízo e logo após foi liberado. Mas, como o delegado Fabiano Oliveira já havia pedido o mandado de prisão do mesmo, ocorreu que foi expedido pelo poder judiciário no final da tarde daquele dia. Então, os investigadores foram até o endereço do agressor e cumpriram o mandado de prisão.

“Medo de que a pessoa que nunca imaginei que fosse capaz de tamanha violência, possa voltar a me agredir”, é o que diz sentir Roseli, além da dor moral e física.

A falta de uma delegacia da Mulher

Ainda por ocasião das ameaças, Roseli procurou a polícia. Mas o que ouviu foi que não havia nada que pudesse provar as ameaças. E então, ela não conseguiu fazer a denúncia, o que certamente numa delegacia da Mulher teria uma averiguação mais específica.

Além dos números alarmantes, casos como o de Roseli demostram que a delegacia da mulher é uma necessidade gritante em Laranjeiras do Sul, município que figura entre os mais violentos contra a mulher, no Estado do Paraná. De acordo com um estudo realizado pelo delegado Fabiano Oliveira, que tem como pesquisa em sua tese de mestrado, os impactos negativos da violência contra a mulher para o desenvolvimento da região Cantuquiriguaçu, 30% das ocorrências policiais de Laranjeiras são de violência contra as mulheres.

A expectativa é de que a Governadora Cida Borghetti, agora na condição de demonstrar sua sensibilidade na prática, viabilize a Delegacia da Mulher, no município.

A criação de um coletivo de Mulheres

Na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) algumas professoras vem realizando pesquisas e projetos de extensão voltados à temática de gênero e abordando a questão da violência contra as mulheres do campo e da cidade. Algumas delas hoje estão fazendo parte de um coletivo de mulheres que surgiu também em solidariedade à agressão sofrida por Roseli.  O coletivo conta com militantes de movimentos sociais, integrantes do Conselho da Mulher, professoras da rede pública estadual e municipal, artistas, profissionais liberais, entre outras. O mesmo atuará em diferentes frentes de ação, como formação e debate sobre questões de gênero, ações diretas, acolhimento de mulheres que tenham sofrido agressões ou que estejam em relações abusivas, além de formação de grupo de percussão com mulheres, entre outras identidades.

Durante a primeira reunião do Coletivo de Mulheres, realizada do dia 14 de abril, foi consenso entre as presentes, que o objetivo do grupo é disseminar apoios práticos e conscientização para que mais mulheres vão tomando consciência da condição de oprimida e que juntas enfrentem as mazelas do machismo que vão desde a diferença de tratamento entre os gêneros nas escolas, passando pelo tratamento discriminatório à profissionais que mesmo ocupando o mesmo cargo que colegas homens, são discriminadas no exercício da função, por serem mulheres, até o encorajamento para a denúncia e combate à violência de qualquer natureza.

2 comentários sobre “Violência contra a mulher é feio para quem pratica: Roseli Cecatto fala sobre a tentativa de feminicídio que sofreu

  1. Não podemos deixar isso voltar a acontecer, a luta da mulheres contra o machismo e todo este “issmo” deve ser reafirmada, reforçada….NÃO aceitamos.

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