Esquecendo marcas de guerras, dentista angolano dá exemplo de resiliência

Impossível não prestar atenção na figura do dentista do OdontoSesc, Gerson Jacinto Tomás, de 32 anos. Tanto pelo sotaque, como pelos traços físicos e a maneira cordial com a qual trata a todos. Perguntado sobre sua origem, conta que é angolano por meio de sua história dá exemplo de resiliência – quando a pessoa não se deixa abater por dificuldades enfrentadas, além de demonstrar um conhecimento político invejável para muitos brasileiros.
Gerson veio para o Brasil em 1996, fugindo das frequentes guerras civis. Filho de um pastor e de uma comerciante, ele contou com alguma ajuda dada pela igreja Adventista, para a qual seu pai trabalha, para pagar a faculdade, agarrou a oportunidade e hoje, ao contrário da maioria de seus conterrâneos, tem profissão e a exerce. Por ter se casado com uma brasileira, com quem tem um filho de um ano e três meses, ele diz que se sente brasileiro.
Sobre ser negro e estrangeiro, ele reforça “você quer dizer, negro e estrangeiro no Sul do Brasil, né?”, acrescentando que vê uma diferença de tratamento para negros estrangeiros e nascidos aqui. Ele comenta que o preconceito com o negro local é maior. “Como se vindo de fora, fosse permitido ser negro, ou como se o histórico de exploração que passaram os negros aqui, ainda fizesse algum sentido, o que com certeza faz. Mas o olhar sobre esse sentido ainda é confundido como algo legítimo dentro daquele contexto, mesmo que sejam expostas todas as atrocidades”, menciona Gerson, falando sobre as políticas públicas para segmentos como o Movimento Negro. “Sou a favor das cotas. Mas penso que não pode ser algo permanente. Que seja necessária apenas para uma geração que precisou atenuar a diferença. Mas que as novas gerações vão se inserindo em igualdade de condições, dispensando a necessidade de tal paliativo”.
Com relação a seu país, Gerson conta que seus pais voltaram para lá, em função da aposentadoria, e que deixaram seu irmão brasileiro, que nasceu logo que chegaram, num internato, coisa comum, segundo ele, para famílias refugiadas. Ele diz que também viveu a adolescência em internato. Conta ainda que seu irmão o visita em Curitiba a cada seis meses.
“A angola é um país rico com população paupérrima. O segundo país da África em petróleo, e também rico em minerais e diamantes”, ressalta, ao atribuir a pobreza de sua gente à exploração. Primeiramente interna, seguida de conivência com a exploração externa, segundo ele, durante um mandato de 40 anos, do ainda atual presidente Eduardo dos Santos. Na angola, até hoje, só houve três eleições diretas desde a sua independência de Portugal, em 1975.