ECA completa 25 anos em meio a avanços e retrocessos

“O que se faz agora com as crianças é o que elas farão depois com a sociedade.” (Karl Mannheim)

Dentre as tantas frentes de ações preventivas e reparadoras, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que comemorou 25 anos, nesta segunda-feira (13) – em luto pelo não entendimento de maioria da sociedade, com relação à redução da idade penal – tem como prerrogativa reger o destino de meninas e meninos que podem ter na adoção a única chance mudar a história.

Enquanto esperam a aplicação integral do ECA, essas crianças e adolescentes vivem em abrigos, onde as equipes fazem todo um esforço para mantê-las em clima de acolhimento, mas a condição de institucionalizado deixa marcas muito distintas da vivência em família, embora muita coisa positiva aconteça, como cursos e oficinas.

Em Laranjeiras existe a Organização Não Governamental Serviço de Obras Sociais (SOS), onde chegam crianças e adolescentes, trazendo um histórico de violência, miséria e falta de esperança. Em geral, são encaminhadas pelos conselhos tutelares, após denúncia de maus tratos, negligencia ou abandono. A falha apontada, é sempre na família, qualquer que seja o modelo (Pai, mãe e irmãos, só mãe, só pai ou familiares extensivos), que em algum momento comprometem por muito tempo, o direito à dignidade e desenvolvimento saudável, desses garotos, por gerações, muitos sem previsão de um bom futuro, antes mesmo de nascer.

Embora ressalte-se que o SOS de Laranjeiras é um dos abrigos mais modernos e bem estruturados, a necessidade de acolhimento afetivo de fato, é expressada por cada Criança, e nesse sentido, reforce-se o que diz a Juíza Samantha Barzotto, em sua entrevista, com relação à necessidade de participação e colhimento da sociedade, seja adotando visitando ou fazendo o apadrinhamento dessas crianças, o que ressalve-se ainda, Laranjeiras está a anos luz, a frente de outras comarcas, em que muitas vezes o direito de convivência é cerceado.

A opção que vem depois, para aquelas crianças e adolescente que não foram acolhidas em seio familiar, é o Centro de Socioeducação Laranjeiras do Sul (Cense). Exclusivamente masculino, com 88 vagas sempre quase todas lotadas, os garotos que chagam lá, vêm de diversas cidades do Estado. “Aqui, ofertamos muitos curso que visam a ressocialização e aprendizado dos garotos. Sabemos que o que os trás aqui é uma sequência de falhas no percurso social das famílias, o que os atinge, principalmente na idade da adolescência”, considera o diretor e educador social, Rafael Lobatiuk. Ele acrescenta que a instituição está preces a aprovar novos cursos e oficinas, com ações de voluntários que tenham interesse em ensinar cidadania, educação sexual. “Queremos reativar também o projeto de horta”, completa Rafael, destacando a importância dos trabalhos que são realizados por instituições religiosas como a Igreja Metodista e grupo de Carismáticos da Igreja católica.

 

 

Entrevista com a Dra. Samantha Barzotto, Juíza de Direito  da Vara Criminal e Anexos, em Laranjeiras do Sul.

JC – Ainda ouvimos dos segmentos que trabalham com crianças e adolescentes e do judiciário, que os pretensos pais adotivos têm preferência quase que exclusiva por recém-nascidos de pele e olhos claros. O que explica essa forma de exclusão?

Juíza – A adoção é um ato de amor, uma experiência humana ímpar. Traduz-se na oportunidade de crianças e adolescentes que estão acolhidos em instituições de encontrar amor e segurança no seio de uma família. São pessoas em desenvolvimento que viveram uma história de abandono e negligência e que sentem o grande desejo de ser filho, de ter pais e irmãos, sendo que acima de qualquer bem material, têm grande necessidade de afeto, carinho e compreensão. 

Infelizmente, ainda há interessados em adoção que possuem essa preferência, até mesmo por falta de conhecimento e preconceito. A adoção não deve ser vista como a última possibilidade de se ter filhos, mas como uma outra forma de ser pai e/ou mãe, uma outra forma de se proporcionar amor, exercendo um dos mais importantes valores da vida.

Por essa razão surge a importância em fomentar a adoção inter-racial, de grupo de irmãos, bem como a adoção tardia (de crianças e adolescente com mais idade). Os pretendentes à adoção frequentam cursos e passam por acompanhamentos psicológicos e com assistentes sociais, a fim de que aprofundem os conhecimentos sobre o que é a adoção.

 

JC – O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, que, caso a família não apresente condições de tutelar a criança ou o adolescente a justiça destitua o poder familiar, ou seja, romper vínculo com família de origem para que possa ser colocada no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), e assim ter a chance de encontrar uma família substituta. Como a senhora vê esse item, na prática?

Juíza – Toda criança e adolescente possui o direito fundamental de ser criado no seio de sua família. Assim, a destituição do poder familiar ocorre em casos excepcionais, quando forem esgotadas todas as possibilidades de intervenção na família de origem ou extensa.

O processo de destituição do poder familiar é tratado com muito cuidado e acompanhado por equipe técnica, psicólogos e assistentes sociais, visando restabelecer o vínculo. Quando esgotadas todas as possibilidades, é que ocorre a destituição do poder familiar pelo Poder Judiciário. Assim, insere-se a criança/adolescente no Cadastro Nacional de Adoção, para que ela tenha a oportunidade de encontrar uma outra família.

 

JC – De um lado. Sabemos que muitas crianças abrigadas imploram por uma família. De outro, muitos pais habilitados à adoção também se deparam com burocracia e falta de destituição familiar nos processos dos possíveis futuros filhos. De que forma isto poderia se equalizar?

Juíza – Os processos que envolvem crianças e adolescentes acolhidos possuem prioridade absoluta de tramitação e devem atender a todos os requisitos legais, justamente diante dos danosos efeitos que se poderia ter caso houvesse a destituição prematura de uma criança/adolescente do seio de sua família de origem. Vale ressaltar que por ser direito fundamental da criança/adolescente ser criada no bojo da família de origem, a destituição deve ser tratada com muito cuidado e é medida excepcional. Portanto, nem todas as crianças que estão acolhidas podem ser adotadas.

 

JC – Porque a adoção ainda é um assunto restrito a alguns perfis de pessoas no Brasil, parecendo estar relacionada a uma ideia de dar preferência às relações consanguíneas, como se estas tivessem garantias de produzir pessoas bem sucedidas?

Juíza – Infelizmente, ainda existem muitos mitos e preconceitos sobre a adoção, até mesmo por falta de conhecimento. Assim, é importante uma participação maior da sociedade e de todos os órgãos públicos – dentre eles do Poder Judiciário – para que haja maior divulgação e esclarecimento de todos.

 

JC – O que podemos comemorar e o que devemos lamentar nesses 25 anos da Lei?

Juíza – O Estatuto da Criança e do Adolescente é um dos mais avançadas do mundo no que concerne à proteção dos direitos destes. No entanto, no tocante à alguns dispositivos, ainda há dificuldade prática de implementação diante da falta de recursos e estrutura do Estado. Daí surge a importância de uma maior participação de todos no sentido de cobrar para que os direitos das crianças e adolescentes sejam atendidos com prioridade.

A única maneira permitida por Lei para se adotar uma criança ou adolescente é se cadastrando junto à Vara da Infância e Juventude do Município ou no Fórum. Todo o processo de adoção do Juizado da Infância e Juventude é gratuito.

QUEM PODE ADOTAR?

Pessoas maiores de 18 anos, após habilitação realizada na Vara da Infância e Juventude do Município ou no Fórum, respeitando-se a diferença de 16 anos entre o adotante e o adotado

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