Brasil: Um país contraditório

*Gilvani Scatolin Leite é Engenheiro Agrônomo pela Unesp, Mestrando em Agroecologia pela UFFS – Laranjeiras do Sul e colunista de Comcafé sobre Agroecologia e assuntos relacionados ao meio ambiente, sustentabilidade e sociedade.

Os dados aqui hora apresentados são uma amostra dos principais gêneros agrícolas produzidos no Brasil e alguma produção mineral, neste caso o minério de Ferro, mas mesmo com essa pequena parte amostral é possível perceber a potência agrícola que o Brasil representa.

Segundo dados coletados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), do SIDRA (Sistema IBGE de Recuperação Automática), da Associação Brasileira de Criadores de Suínos, da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimentos) e outras fontes, o Brasil está entre os primeiros colocados na lista mundial de Maiores Produtores Agrícolas do Mundo com uma marca que atinge os 400 bilhões de quilos de gêneros alimentícios anualmente.

Dentre os diversos itens alimentícios produzidos no Brasil destacam-se a soja com 241 bilhões de quilos e o milho, 81 bilhões de quilos, seguidos da produção de arroz, 12 bilhões de quilos e outras produções de cereais e tubérculos (trigo, batata, feijão e aveia) que somam 15 bilhões de quilos ao ano, tabela 1.

A produção de frutas, por sua vez, soma-se 35 bilhões de quilos, com destaque para a laranja, 17 bilhões, banana, 6 bilhões e melancia 2 bilhões, o restante (abacaxi, mamão, uva, maçã, limão, manga e melão) somam-se quase 9 bilhões de quilos, tabela 2.

Já a criação de animais nos estabelecimentos agrícolas ultrapassa 1 bilhão de cabeças, sendo 1 bilhão de galináceos , 217 milhões de bovinos, 1,6 milhão de suínos e 1,3 milhão de bubalinos, tabela 3.

Se todo este alimento fosse dividido igualitariamente entre a população brasileira que é de aproximadamente 210 milhões, cada habitante usufruiria de 744 kg de alimentos por ano, 62 kg/mês, 2 kg/dia, ou seja, nenhum brasileiro seria assolado pela fome, entretanto, cerca de 5% da população (FAO-Brasil, 2017) convive com a fome, e grande parte dos 95% restante convive com a Insegurança Alimentar. Onde está o problema?

Por que, mesmo com esta exorbitante produção agrícola, ainda há cerca de 11 milhões de pessoas, só no Brasil, que passam fome?

Para onde vai à parte de alimentos que seriam para elas, para onde vão os 22 milhões de quilos de alimentos diários desta população?

Torna-se evidente que a fome não é consequência da ineficiência da produção agrícola brasileira. Pelo contrário. Produz-se um volume tão grande de alimentos que se poderia alimentar ao menos 3 vezes toda a população em 1 ano. No entanto, a melhor e a maior parte da produção primária são exportadas e o que fica no país são apenas os alimentos que não são classificados para a exportação os quais ainda sofrem internamente seleção de acordo com sua qualidade e de acordo com o consumidor final, ou seja, alimentos de boa qualidade para pessoas das classes médias a altas e de baixa qualidade para as camadas sociais baixas.

Não obstante, no ano de 2016, segundo o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), o Brasil faturou US$ 96 bilhões com exportações de soja, o país que mais importou foi a China com cerca de 80% da produção.

Relacionando o protagonismo da soja ao sistema alimentar, ela não é consumida diretamente pela população, mas de forma indireta, através do consumo de carne e do resíduo da prensagem, o óleo de soja.

A produção de soja é importante do ponto de vista do valor de comercialização, US$ 96 bilhões (x R$ 3,40 – 2016), que se dividido igualitariamente pela população brasileira, cada habitante receberia US$ 457,14 (R$ 1.554,27) mais 2 kg de alimentos por dia, ou seja, aumentaria a renda familiar, as pessoas poderiam pensar em outra coisa que não em conseguir alimento e certamente não haveria gente à beira da miséria.

Além disso, as exportações de minério de ferro, em 2011, de acordo com dados do IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração) foram de 390 milhões de Toneladas cujo valor alcançou os 42 bilhões de dólares (x R$ 1,86 – 2011). Se este valor fosse dividido pela população brasileira, cada um receberia US$ 372,00 (R$ 691,92).

Somente com estes poucos dados tem-se a noção de que o Brasil não é um país pobre, pelo contrário, é um país que tem potencial de ser referência mundial de desenvolvimento populacional, erradicação da fome e da miséria. Entretanto, o setor de produção e comercialização atende a outros interesses.

Observação: *A soja não entra no cálculo, pois é utilizada, quase que exclusivamente para a alimentação animal, cujo cálculo aparece na sequência.

 

 

Deixe comentário

Seu endereço de e-mail não será publicado. Os campos necessários são marcados com *.