Mesmo com toda a relevância histórica, a luta das mulheres por garantia de direitos e liberdade igualitária é como a Fênix – precisa sempre renascer das cinzas. Não podendo descuidar das conquistas, muitas eternamente em curso, outras sempre na mira do machismo “natural” e oportuno.
Imagem ilustrativa - Galatea, uma figura imortal e histórica.
Imagem ilustrativa – Galatea, uma figura imortal e histórica.

O Dia 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, costuma ser repetitivo e ainda pouco entendido na sua simbologia. É comum em muitos ambientes, que seja reduzido a uma confraternização que vai do café da manhã ao jantar, da floricultura às lojas de perfumes e outros itens direcionados ao público feminino, sem que se faça uma reflexão plausível acerca dos sentimentos de cidadania das mulheres.

A liberdade das mulheres, o direito a reclamar daquilo que a esmaga diante do mercado e de um padrão moral excludente, é tão cerceado, que se uma mulher se levanta, enquanto degusta o elegante café da manhã, oferecido pela empresa no Dia da Mulher, dizendo se preocupar muito com seu bem estar, com a qualidade de vida da sua família, e questionar a preguiça pela adesão à licença maternidade de seis meses, corre o risco de ser demitida no mesmo Dia da Mulher.
A violência contra a mulher não é cometida por homens apenas. Há chefes mulheres que ainda não se sentam na cadeira da sensibilidade com a qual deveria tratar o interesse e dignidade de suas funcionárias, no sentido de equiparar direitos, uma vez que os deveres são mais que igualados.
Assim como a cultura machista está incrustada  em ambos os gêneros. O machismo não é hereditário. É ensinado nas entrelinhas, nos pequenos detalhes, nos comportamentos de mães e pais. Por isso, as as próprias mulheres, se não beberem na fonte de ativistas como Simone de Beauvoir, Sara Winter, e mesmo Elza Soares, que fazem entender a importância dessas discussões e identificar a volência contra as mulheres, não verão nunca a enorme verruga peluda e enfumaçada que carregam em seus rostos.
Há mais e mais lutas… não se pode confundir o direito a liberdade com bondade, com vontade permissiva de quem esteja “naturalmente” no comando. As frentes de batalhas, diversidade de expressão, referências cultuais e geográficas são infinitas. Ainda bem que Cora Coralina simplifica isso:
TODAS AS VIDAS
 
Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé do borralho,
olhando para o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço… Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo…
 
Vive dentro de mim
a lavadeira do Rio Vermelho.
Seu cheiro gostoso d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa, pedra de anil.
Sua coroa verde de São-caetano.
 
Vive dentro de mim a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.
 
Vive dentro de mim a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda, desabusada,
sem preconceitos, de casca-grossa,
de chinelinha, e filharada.
 
Vive dentro de mim a mulher roceira.
-Enxerto de terra,
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos, Seus vinte netos.
 
Vive dentro de mim a mulher da vida.
Minha irmãzinha… tão desprezada, tão murmurada…
Fingindo ser alegre seu triste fado.
Todas as vidas dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera das obscuras!
 
Cora Coralina
Um feliz e útil Dia da Mulher, especial, às leitoras Comcafé!

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